Ensaio
Recebido
em 03 de julho de 2017.
Por
Leal de Campos,
militante
socialista, ex-preso político e economista.
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A imanência de uma questão recorrente |
Quase
sempre se defende a “democracia” como um conceito acordado tanto
por parte das esquerdas como da direita dita “esclarecida”. É
muito corriqueiro se ouvir que “a democracia, com todas as suas
falhas, ainda é a melhor forma de governo”. E baseado nisso,
indispensável se faz ao sistema capitalista manter uma aparência
democrática para continuar atuando, e assim gerir a
sociedade por muito mais tempo.
Ora,
pode-se até se governar por um longo período com base numa
determinada estrutura ditatorial, ou eventualmente
híbrida, através de governos que se mantêm usando
eleições periódicas, indiretas ou não, para justificar a sua
continuidade. Todavia, a melhor opção será sempre a de mascarar
o domínio de uma classe sobre as demais com mecanismos
que regulam as relações sociais como se fossem neutros e igualmente
imparciais perante todos os cidadãos.
Compreender
isso é mais do que imprescindível para se levar adiante as lutas
anticapitalistas, as quais se fazem cada
vez mais emergenciais. No entanto, o atual sistema
socioeconômico, mesmo exaurido e em crise crônica, continua tão
predatório quanto antes e ainda fazendo “a cabeça”
de muita gente, que acha que ele ainda pode ser reformado para melhor
servir à maioria da população em qualquer país.
Quase
sempre os reformistas repetem que não
há condições para novos processos revolucionários hoje
em dia e que, por isso, deve-se participar
dos processos eleitorais e eleger pessoas comprometidas
com algumas mudanças pontuais. Enquanto ainda se estimula os
militantes para que continuem a defender, tão somente, os direitos
humanos e o exercício diário de cidadania nos marcos da
sociedade capitalista em que se vive, evitando-se denunciar
o sistema e as
suas mazelas sociais. E a explicação quanto a isso passa
pela anuência de que basta trocar a governança de plantão por
outra e tudo estará resolvido.
Sabe-se,
entretanto, que governo não é um poder real, visto que pode
ser substituído,
de qualquer modo, através de eleições regulares ou por
dispositivos constitucionais em situações de urgência, atendendo
aos interesses das classes dominantes. O poder
verdadeiro é praticado pelo Estado, que representa uma
determinada classe (burguesia) a qual exerce
o mando político em todos os níveis e instâncias
diretamente ou por meio de seus prepostos, escorada numa suposta
normalidade.
De
outro lado, avaliando-se as variáveis do processo de desagregação
do sistema capitalista que se dá por todo o mundo, em face das suas
crises cíclicas, permanentes, sistêmicas e
estruturais, pode-se afirmar que há, sim, condições
objetivas para o pleno desencadeamento de insurreições
que poderão se transformar em possíveis
revoluções através de um factível e consequente
desdobramento positivo. Entrementes, verifica-se que o que dificulta
isso como resultado esperado é a falta
de consciência política de todos os que são explorados
e o papel contrarrevolucionário
das direções pelegas sindicais e partidárias, que vendem “gato
por lebre”. Tudo fazem para manter as lutas num grau em que não se
coloque em xeque a ordem política e econômica em vigor, e para que
possam negociar alguns
poucos ganhos como se fossem vitórias importantes.
Mas
entende-se, em sentido contrário, que se deve insistir na
organização pela base, fundamentada na autonomia
e independência das massas em geral e, especificamente,
da classe trabalhadora. E, dessa forma, tentar se reconstruir as
lutas de todos os movimentos populares no sentido de um enfrentamento
direto contra o capital, em cada país. Sendo que uma das
tarefas mais imediatas é a de se desencadear e consolidar uma ampla
campanha para impopularizar
o atual sistema socioeconômico em todos os lugares, mostrando-se
o seu verdadeiro papel opressor e destruidor que, como já se sabe, é
inerente à sua própria existência.
Muitas
revoltas têm ocorrido pelo mundo afora, indicando um profundo
descontentamento para com o sistema e os governos que o
servem. No entanto, é preciso que se explicite que existe uma grande
diferença em relação a um andamento revolucionário, visto que as
rebeliões expressam apenas insatisfações, mas não evidenciam
propostas de mudanças
profundas. Já as revoluções representam o desejo dos explorados em
transformar a sociedade em que se vive, sepultando o modelo vigente e
implantando uma nova ordem
que seja capaz de viabilizar uma eficaz participação popular
massiva, gerindo os seus
próprios destinos através das ações de
auto-organização, por exemplo.
Todavia,
o que tem causado grande indignação é o descaramento das
esquerdas reformistas em negar
as circunstâncias objetivas e obstruir os esforços de todo um
trabalho de conscientização para uma procedente
concretização das condições subjetivas, através
do esclarecimento do que se passa ao nosso redor numa linguagem
simples e direta. Pois é, sim, uma inverdade comum que as
massas em geral não sejam
capazes de entender e compreender as propostas
revolucionárias, uma vez que não têm estudos suficientes para
apreender o significado das coisas.
Que
se encontrem, por conseguinte, novas possibilidades para um novo
e abrangente campo revolucionário, que possa ser
portador de uma mesma esperança de mudança
efetiva: anticapitalista, feminista,
antirracista e, essencialmente, democrática. Ou seja,
que o futuro venha a ser vermelho e negro, juntando
anarquistas e marxistas, no mesmo
lado das lutas pela erradicação global do capitalismo.
Entende-se
que através desses caminhos o socialismo e o comunismo do século em
curso deverão se assentar nessas
duas fontes de radicalidade libertária, que se colocaram
antes sob o idêntico signo da I Internacional, fundada em 1864. Uma
associação pluralista
que conheceu, em seus primeiros anos de atuação, convergências
entre suas correntes políticas revolucionárias, as mais radicais da
história da humanidade.
Porém,
a cada dia que se passa, percebe-se que uma tragédia em escala
planetária já sinaliza o caos precedendo a barbárie, sem que se
possa contar com as mínimas
condições de neutralizar esta tendência. Mesmo assim,
alguma coisa tem que ser feita rapidamente e isto passa pela
necessidade premente
de se encorajar os processos revolucionários mundo afora,
reafirmando repetida e continuadamente a necessidade da transformação
política e social e de firmes
denúncias contra o sistema capitalista. E diante dessa
crucial realidade, enfatiza-se mais uma vez que se está diante de um
repetido dilema, que exige respostas consistentes
e exequíveis para se solucionar a persistente
dicotomia entre reformismo e revolução,
como uma escolha a ser feita de imediato.
Isso,
com toda a certeza, deveria se dar na direção da segunda
opção sem medo de se cometer qualquer erro ou equívoco,
refutando-se destarte os entraves contrarrevolucionários de uma
nefasta conciliação
entre classes que se dá em detrimento da maioria das populações
espoliadas. Eis a evidente questão que continua
sendo posta no presente.
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Um clássico livro da literatura marxista |
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