Ensaio
Recebido
em 04 de outubro de 2016
Por
Michel Zaidan Filho, filósofo, historiador, cientista
político, professor da UFPE e coordenador do NEEPD/UFPE – Núcleo
de Estudos Eleitorais, Partidários e da Democracia.
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Crivella (PRB), candidato à prefeitura do Rio de Janeiro em 2016:
religião e política
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Fui
submetido a uma bateria de questões por um amigo-editor sobre o
resultado das últimas eleições municipais no Brasil. Essas
eleições ocorreram num ambiente de profunda insegurança jurídica,
de impunidade (em relação aos “políticos ficha suja”), de um
monopólio “partidário” dos meios de comunicação, do desgaste
político do PT e da esquerda, do crescimento do voto evangélico e,
porque não dizer, de um Estado de Exceção, capitaneado pela
Polícia Federal e o ativismo da magistratura.
Como
apurou a mídia, as candidaturas mais bem aquinhoadas financeiramente
venceram ou foram para o segundo turno das eleições. Os grandes
partidos, sobretudo de centro-direita, aumentaram suas bancadas. Os
candidatos da igreja reformada chegaram ao segundo turno. De forma
que, pelo andar da carruagem, teremos legislaturas e executivos
municipais mais à direita, mais conservadores. Diria um pescador
(não de almas ou de águas turvas), o mar não está para peixe.
Retrocedemos à época em que a nossa política de sobrevivência é
a defesa dos mínimos sociais, numa frente de massas, diante das
ameaças desse governo temerário, composta de aposentados,
trabalhadores, estudantes, funcionários públicos, donas de casa,
pessoas sem-teto, sem emprego, sem escola etc.
Não
fosse a ida de Marcelo freixo (PSOL) para o segundo turno no Rio de
Janeiro, contra o bispo da Igreja Universal, e a ida de João Paulo
(PT), no Recife, contra o representante local da oligarquia política
que tanto nos infelicita aqui, dir-se-ia que a catástrofe política
teria se abatido de uma vez sobre o país, com ou sem a benção do
nosso senhor Jesus Cristo. Já o reflexo disso sobre as eleições
presidenciais e estaduais, daqui a dois anos, não prenunciam boas
novas. A depender do curso da economia (e da crise internacional), da
base fisiológica de sustentação do atual mandatário presidencial,
e da conspiração dos partidos que o colocaram na cadeira da
Presidente Dilma, pode-se ter ainda muitas surpresas desagradáveis
nesse ínterim eleitoral. Fala-se em eleição indireta, em 2017, já
com pretensos candidatos.
Afirmei
que o ciclo político de centro-esquerda tinha se esgotado no Brasil,
e que não tinha aparecido alternativas fortes, consistentes, que
pudessem se apresentar à exaustão do ciclo político. O nome de
Lula não pode ser essa única alternativa. Sobretudo, em face das
manobras e escaramuças do juiz Sérgio Moro, destinado como está a
criminalizar o PT e suas lideranças políticas. O PSOL ainda não
tem a musculatura suficiente para oferecer um nome e granjear
alianças necessárias para tornar viável uma candidatura
presidencial. Tem um longo caminho a percorrer. Não acredito também
na viabilidade eleitoral de qualquer um dos caciques do PSDB, apesar
da vitória do empresário e marqueteiro João Dória, eterno
adulador dos tucanos.
Assim,
se a crise econômica perdurar, a solerte invasão religiosa
continuar, se uma certa classe média reproduzir o noticiário
venenosa da mídia golpista desse país e a ditadura do judiciário
se mantiver, fora de todo e qualquer controle constitucional, a porta
estará aberta a todos os aventureiros, messias, salvadores da pátria
de todas as igrejas existentes. Nem sempre a crise política e
econômica, num ambiente de perda de confiança nas instituições
republicanas, é uma janela de oportunidade para candidaturas
progressistas e mais avançadas. Pode ser o atalho perigoso para o
discurso da frustração política, dos “outsiders”, dos que se
proclamam não-políticos, mas portadores da eficiência, da
competência gerencial, da honestidade a toda prova etc. Se fosse
religioso e frequentasse algum templo, rezaria muito para que esse
tipo de messias não aparecesse tão cedo. E que o apocalipse da
democracia fosse evitado.
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