Ensaio
Recebido
em 04 de julho de 2016
Por
Maicon Vasconcelos, professor e mestre em História.
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A espetacularização do 1º de Maio |
O
livro “A sociedade
do espetáculo” do crítico francês Guy Debord, se propõe
a refletir sobre as modernas sociedades e as metamorfoses do
fetichismo da mercadoria. Já em sua primeira tese, ele explica
que em “Toda a vida das sociedades nas quais reinam as condições
modernas de produção se anuncia como uma imensa acumulação de
espetáculos. Tudo o que era diretamente vivido se esvai na fumaça
da representação”. E o que isto tem a ver com o 1º de
Maio, dia
do trabalhador?
Em nossos tempos, tem tudo a ver com a realidade brasileira.
Há
longínquos mais de 150 anos, precisamente em 28 de
setembro de 1864, em Londres, fundava-se – com a presença de
trabalhadores de vários países do mundo e matizes políticos, junto
com movimentos (comunistas, anarquistas, etc.) – a Associação
Internacional dos Trabalhadores (AIT), a 1ª Interacional, que
lutava pela construção de uma sociedade justa, livre
e igualitária. Regia-se, assim, sob o horizonte socialista.
Mas, o marco do que hoje conhecemos como “dia do trabalhador” só
ocorreria em 1886, na cidade de Chicago, quando na véspera de
1º de Maio, conclamando uma greve geral, os
operários de Chicago, na madrugada distribuem o panfleto que
encetava num de seus trechos: “A partir de hoje nenhum operário
deve trabalhar mais de oito horas por dia”. Encadeou-se, então,
uma onda de greves que resultaria em muitos trabalhadores mortos e
feridos.
A
luta por essa reivindicação continuou ano a ano e, em 1889,
no Congresso Operário de Paris, donde se originaria a Internacional
Socialista ou 2ª Internacional, é também deliberado que anualmente
os trabalhadores, em escala mundial, deveriam organizar manifestações
em uma data fixa, pela redução da jornada para oito horas e
outras reivindicações. Esta data era o 1º de Maio,
sendo sagrada por decreto em 1891, em Bruxelas, no 2º
Congresso da Segunda Internacional, como o Dia Internacional dos
Trabalhadores. Já no Brasil, a partir de 1890,
também começam movimentos de trabalhadores pela luta das oito
horas de jornada. Ou seja, as origens desta data remontam a um
passado de muitas lutas, sacrifícios e conquistas para trabalhadores
e trabalhadoras.
Depois
desta breve rememoração histórica, voltemos a questão de quais os
paralelos entre o 1º de Maio em nossos dias e a dita
“Sociedade do espetáculo” manifestada por Debord. Ainda
que muito presumível e óbvio mesmo para um observador desatento,
não é demasiado enfatizar que diferentemente daquele Dia do
Trabalhador histórico acima narrado, inscrito no decorrer dos
anos sob a insígnia da luta contra a exploração e
opressão do capital e do Estado, hoje o cenário se
apresenta de modo muito diverso. O que temos são centrais
sindicais que representam os interesses dos empresários e do
governo, em detrimento dos trabalhadores. E assim, todo 1º de
Maio, armam um picadeiro (verdadeiro espetáculo) e
chamam os trabalhadores para se idiotizarem com o sorteio de carros,
casas, shows, etc. Portanto, alienando-os com esses
eventos festivos e caros, mas vazios em conteúdo crítico, enquanto
a exploração dos patrões e a precarização
das condições de trabalho, bem como a correlação de forças
permanece inalterada, ou antes, beneficiando diretamente os patrões
e os governos de plantão.
Tanto
aqui como em outros países da América Latina houve nos últimos
anos um retorno do populismo com novas peculiaridades e
inovações, mas mantendo sua centralidade de, a serviço da classe
dominante, buscar “conciliar capital e trabalho” via alienação
das massas, atrelando ao Estado, quando possível, sindicatos
e outras entidades de representação dos trabalhadores. E na
contramão da efusiva propaganda apologética aos
governos, avança a desregulação e a precarização das condições
de trabalho no Brasil, destacando-se entre as tantas perdas
trabalhistas, a terceirização que caminha a passos largos
com a lei 4.330.
Mas,
o Dia do Trabalhador, mesmo tão espetacularizado
como está, ainda é um campo em disputa e cabe aos trabalhadores e
trabalhadoras reivindicá-lo para si mesmos.
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