Ensaio
Recebido
em 18 de fevereiro de 2016
Por
Manoel Severino Moraes de Almeida, sociólogo,
cientista político e bacharel em Direito. Membro da Comissão
Estadual da Verdade Dom Helder Câmara e da Comissão de
Anistia do Ministério da Justiça.
Resumo:
O
presente [texto] busca analisar o debate contemporâneo sobre a
chamada liberdade negativa em um Estado Democrático
e de Direito à luz do pensamento de Otfried Höffe,
autor de A democracia no mundo hoje (Martins Fontes, 2005).
A democracia na perspectiva dos direitos humanos é uma construção histórica, cultural, social, econômica e política. As gentes e suas múltiplas culturas abordaram o problema do poder considerando dois fatores decisivos: sua origem [de onde surge?] e sua filosofia. A resposta invariavelmente dirá respeito à busca do controle político e social.
O
Estado-nação, enquanto projeto político, surge exatamente para
consolidar uma visão de poder em que o Estado controla os anseios e
desejos do povo. E estabelece mediação entre o coletivo e o
indivíduo: surgem os direitos civis e políticos,
consolidando princípios como o do público e do privado; a garantia
da ampla defesa e do contraditório, e um sistema jurídico
profissional e independente.
Dois
pilares desse Estado mediador: a legitimidade e o contrato social.
Passam a estruturar o grande edifício da democracia moderna. A ideia
de leis aprovadas por um parlamento eleito pelo voto (secreto e sem
imposições) é garantidor da qualidade com que uma sociedade
consolida seu sistema de justiça.
É
nesse processo que as relações político-jurídicos vão se
adensando e produzem uma trama de interesses bastante complexa e
utilitarista. Como destaca Höffe (2005, p.42), “O utilitarismo é
compreendido como a ética do bem-estar coletivo de efeito mais
vigoroso”.
O
sistema político utilitarista promove uma racionalidade focada na
intrínseca contradição entre a liberdade e o controle. É desse
processo que surge a metáfora do contrato social onde os indivíduos
abrem mão de suas vontades soberanas para assimilar a auto-obrigação
voluntária.
Na
prática, estamos saindo de uma leitura moral do poder para
consolidarmos um equivalente a racionalidades deliberativas, seja
direta ou indireta. E para consolidar estes mecanismos de legitimação
é fundamental a institucionalização do poder do Estado. Que, para
se firmar diante dos seus cidadãos, vai aumentar a sua capacidade de
atuação e consequentemente estabelecer uma maior valorização do
seu papel jurídico e político.
O
que temos de novo quando falamos de direitos humanos é a ideia de um
contrato duplo, onde os direitos pactuados em nossa Constituição
também podem ser assimilados do Direito Internacional dos Direitos
Humanos. A inversão é no reconhecimento que o pacto de origem pode
ter sido unilateral, e com isso imposto.
A
consolidação de um direito internacional amplia a responsabilidade
dos dirigentes públicos e catalisa uma gramática de referências do
dever ser do Estado diante dos seus cidadãos. Logo, o papel das
organizações públicas transcende, significativamente, o seu papel
de regular comportamentos. Em compensação, é confrontado com
limites de sua atuação na esfera pública e privada.
O
processo civilizatório dos povos e o aprofundamento das experiências
políticas permitirão consolidar um modelo de alteridade, onde o
outro é reconhecido em sua dimensão singular ou coletiva, racial ou
de gênero. A máxima moral do Estado clássico e totalitário passa
a dar lugar à “minima moralia” onde os grupos e minorias
devem ser respeitados em sua dignidade e costumes.
A
consolidação de uma agenda de direitos humanos está relacionada à
real capacidade de diagnosticar as lacunas em nossos processos
democráticos. São essas interrupções ou territórios cinza[s] de
ausência de direitos que permitem proliferar todo tipo de
violências. Então, diante dessa afirmação, não podemos tratar da
defesa da vida se não reconhecermos que a vida social, política ou
ambiental esteja ameaçada.
O
fator determinante para o desenvolvimento do Estado de Direitos é
naturalmente a capacidade de ocupar os sentidos de uma pluralidade
política de atores sociais que passam agora a exercer o controle do
Estado e de suas ações. É nesta mudança estrutural que surgem as
ações afirmativas e uma gama de outros mecanismos de direitos
humanos capazes de democratizar o Estado e o poder político.
Os
Conselhos e suas atribuições legais de controle, fiscalização e
formulação de políticas públicas são lugares privilegiados para
conseguir convergir divergências, críticas e, por outro lado,
mediar processos. Consolidar os direitos humanos é assumir os
compromissos internacionais e, ao mesmo tempo, no âmbito interno,
consolidar vários sistemas de garantias de direitos econômicos,
sociais e culturais.
![]() |
Edição brasileira do livro de Otfried Höffe,
lançado originalmente em 1999
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Brilhante texto de Manoel Severino Moraes de Almeida!
ResponderExcluirFazendo algumas considerações como leitora voltaria para” a chamada liberdade negativa” em A democracia no mundo hoje de Odfried Höffe e afirmaria que a democracia européia agoniza, já passou do estado de uma possível dialética negativa da democracia para anunciada morte lenta da democracia. Ela agoniza pela longa crise do neoliberalismo econômico do capitalismo, que como câncer mata lentamente democracia que luta entre ser ou não ser para o povo. Não é de agora que a democracia morre e ressuscita, que diga os Gregos.
hoje, quando sou testemunha do desespero e flagelo dos exilados tentando entrar na Europa como um bando de todas as partes numa procissão dos aflitos correndo da guerra que os senhores da guerra e a industria bélica provocam, volto para a minha bíblia ANARQUIA, ESTADO E UTOPIA de Robert Nozick.
Descrente pela própria natureza, até mesmo da minha bíblia, ainda volto a crer a Democracia deixa de ser Democracia quando entra o do ESTADO como o principal meio.
O homem tem que criar, formar e lutar por uma consciência democrática que exija do Estado um Estado Democrático. A democracia de Estado sempre vivem agonizante até a morte porque o câncer do capitalismo continua matando os frágeis Estados Democráticos. Que o diga a Suécia de hoje.