26 de junho de 2015
Por Mário Benning, mestre em Geografia e Professor do IFPE/Caruaru-PE.
Ao observamos a vida política nacional em
diferenças escalas, surge uma constatação aterradora. Na medida em que o nível
de análise saí da esfera nacional e vai descendo, passamos do desolador no
nacional para o catastrófico, caótico mesmo, no nível local. Afinal, a grosso
modo e com todas as contradições possíveis e existentes, o PT e o PSDB em nível
nacional representam modelos distintos de organização social e de gestão.
Eles realizam com todas as falhas possíveis, um debate sobre o tipo de
sociedade que queremos e as opções existentes para o país.
Contudo, quando chegamos à política municipal, esse
quadro de referências, mesmo que falho, some, desaparece como que por encanto.
Basta olhar a atual configuração da política caruaruense, que sempre foi polarizada,
por vários motivos, menos por razões ideológicas ou de conteúdo político.
Na política municipal ao invés de modelos e ideias,
temos uma política dominada pelo personalismo e pelo culto à figura do líder.
Embora muitas dessas lideranças gostem de se intitular de esquerda
e reafirmem em cada campanha seus compromissos com o ideário popular. Chegando
até a se colocar como tendo sido adversários ferrenhos da ditadura militar para
justificar o rótulo que se auto-atribuem de políticos de esquerda. Como o nosso
atual prefeito.
Porém, se analisarmos as suas gestões, as políticas
e ações implementadas, nas mais diversas áreas, sejam elas sociais ou
econômicas não encontramos grandes diferenças, ou marcas, que caracterizem
realmente essas administrações como tendo sido ou sendo de esquerda. Nunca
houve, e não há, o compromisso real em tornar a cidade mais justa, e de
realmente combater a desigualdade social existente em Caruaru. Principalmente
através da organização de serviços essenciais com o caráter público, gratuito e
de qualidade.
Todas elas foram marcadas, pelo aparelhamento e
inchaço da máquina, pela negligência sistemática com a educação e a saúde. Pela
ênfase em ações midiáticas, e que maquiam o triste quadro de abandono das
nossas periferias. Investindo prioritariamente em obras muitas vezes supérfluas,
enquanto questões essenciais, vitais, são negligenciadas. O discurso inovador,
do desenvolvimento é onipresente em suas bocas, embora nunca se concretize em
solo caruaruense. Verdadeiros vendedores de ilusão.
Nossas lideranças sinalizam à esquerda, mas sempre
governam à direita. Sempre foi assim. Fica clara a irônica afirmativa feita
pelo Deputado Tony Gel em uma entrevista, onde disse que tinha mais
identificação com o social do que as ditas forças progressistas caruaruenses.
Muitas dessas lideranças foram parar em partidos de
esquerda, não por uma questão de identificação programática ou partidária. Mas
sim porque procuravam uma agremiação que servisse de guarda-chuva para seus
projetos eleitorais, que lhes desse uma legenda para controlar e permitisse
atrair o apoio de políticos nacionais em suas campanhas. E se formos olhar o
seu DNA, todos eles têm sua origem na direita, e ainda estão lá…
A recente polarização política em Caruaru é fruto
direto da engenharia gestada na ditadura. Durante os anos 50 e 60 a vida
política caruaruense era dominada por grupos rivais, liderados por João Lyra
Filho e Draylton Nejaim. Duelavam em siglas de direita, a UDN e o PSD. O
principal partido de esquerda na época, o PTB, nunca elegeu um prefeito em
Caruaru, e o Partido Comunista estava na clandestinidade desde os anos 40.
Com o golpe militar houve a dissolução de todos os
partidos políticos, para a criação do bipartidarismo: ARENA e MDB. As
lideranças locais foram obrigadas a repartir as siglas. Draylton, prefeito na
época, assumiu a ARENA, a mais cobiçada por acomodar os vitoriosos do golpe, os
antigos filiados da UDN e setores mais radicais do PSD. Muitas lideranças
nacionais do PSD relutaram em ir para o MDB. Os militares tiveram que apelar
para que os políticos se filiassem ao MDB, para que o mesmo atingisse o mínimo
necessário de filiados para sua criação. Draylton ocupou a ARENA e jogou os
seus adversários no MDB.
A ARENA viraria o PDS e depois o PFL, com Draylton
sendo substituído por Tony Gel. Já o MDB implode em várias siglas, como PMDB,
PSB, PDT e etc., e nossas lideranças políticas locais migram para essas siglas
buscando não uma identificação programática, mais uma sigla para chamar de sua.
Legendas que pudessem dominar e que pudessem controlar livremente, e que lhes
desse uma grife de esquerda, uma aparência. Essa situação é muito parecida
com a criação do PSD, após o Estado Novo em 1945, relatado por Sebastião Nery:
Os interventores
Benedito Valadares, de Minas; Fernando Costa, de São Paulo; Agamenon Magalhães,
de Pernambuco; Amaral Peixoto, do Estado do Rio; o prefeito de Belo Horizonte,
Juscelino Kubitschek; e o prefeito do Rio, Henrique Dodsworth; começaram a
reunir-se no apartamento de Benedito, no Rio, para criarem o partido do
governo. “Qual o nome? – Partido Democrático. Benedito, que só era burro para a
UDN mineira, propôs: – Olhem para a Europa. Os tempos são outros. Vamos botar
uma pitada de social nisso aí. Vamos chamar o Partido de Social Democrático. E
um pernambucano ilustre, Barbosa Lima Sobrinho, amigo de Agamenon Magalhães,
redigiu o primeiro programa do PSD (que nasceu em 17 de julho de 1945) com “uma
pitada de social”.
E é assim também em Caruaru, o social só entra na
política local como discurso, como pitada, nunca como prática. Por isso talvez
seja hora de realmente buscar um governo de esquerda para Caruaru, não apenas
na aparência, mas sim no DNA. O problema é onde encontrar…
Notas
[1] Publicado com
autorização do autor. Originalmente postado em https://caruaruvermelho.wordpress.com/
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