Ensaio
25 de junho de 2014
Por Tato
Silva, ativista
social, bacharel em filosofia e bacharelando em direito.
Como tantos recifenses, eu sou
contra o que o Consórcio Novo Recife está querendo fazer com o espaço do Cais
Estelita. Como tantos recifenses, eu vejo com bons olhos o ativismo por uma
cidade melhor e por uma ideia melhor de espaço urbano numa cidade que já se
encontra caótica e desigual. Como tantos recifenses, eu concordo com a ideia de
que nós somos os responsáveis por defender os espaços e as grandes linhas de
argumentação dessa cidade. Como tantos recifenses, eu sou um fervoroso crítico
da imprensa, da grande imprensa, que só noticia aquilo que quer e segue os
interesses que lhe são mais diretos. Quem fará senão nós? Quem defenderá senão
nós, que somos habitantes da cidade e que teremos prejuízos ambientais,
jurídicos, sociais e culturais com uma dúzia de espigões lá plantados para
servir a apenas alguns?
Há um comercial do Novo Recife na
mídia falando de um projeto excelente, de primeiro mundo, de reconhecido
destaque para “todos” (sic). É óbvio que não há um pingo de verdade nessa
afirmação e que agir em todas as frentes é primordial: seja com a cultura, seja
com a sociedade, seja com a sensação de que contribuímos para que nossa cidade
seja nossa cidade e não só de alguns, dos mais ricos. Nisso o movimento Ocupe
Estelita acertou em cheio.
Mas tenho algumas ressalvas a
fazer sobre alguns pontos específicos. Em primeiro lugar, eu quero rebater este
trecho postado no blog de autoria do professor Érico Andrade, que foi meu
professor no curso de filosofia, com a devida vênia, diga-se de passagem: “As
armas dos Direitos Urbanos são,
sabemos: as leis, a consistência dos argumentos sólidos e técnicos e,
principalmente, a participação de milhares de pessoas...”. Discordo respeitosa,
mas veementemente, que sejam os Direitos
Urbanos os representantes totais dessa luta. A luta é do movimento Ocupe
Estelita que não é composto apenas de pessoas ligadas ao grupo. A luta é de
todo recifense, não apenas os de classe média, como o professor colocou muito
bem em outro trecho do artigo, e não apenas de um grupo, por mais que esse
grupo participe ativamente das ações.
Nós vivemos num mundo no qual a
captação de vontades é mais plural e acéfala do que tudo. Colocar o DU como a
cabeça desse movimento é simplesmente olvidar que não é bem a verdade dos fatos
que está sendo dita. Eu conheço inúmeras pessoas que estão ativas no movimento.
Contudo, essas pessoas não são parte do grupo DU. Eu conheço pessoas que estão
na mesma situação que eu. Que fazem a sua parte diante dos afazeres inadiáveis
da vida para se informar e tentar com um grão de areia colocar a sua força
contra o Consórcio Novo Recife, mas que não são do grupo DU.
A captação, ou cooptação, desse
movimento e desse foco de ativismo preocupa porque me parece ter outros
intuitos além dos de fazer com que o cais não seja transformado num espaço privado.
A consistência de argumentos sólidos, milhares de pessoas envolvidas, entre
outras coisas não são armas do DU, mas do povo recifense. O DU não é o Ocupe
Estelita, por mais que o tenha idealizado e o posto em prática. O DU não ocupa
o protagonismo nessa luta sozinho. Há vozes. Há braços. Há mais pessoas que,
como eu mesmo, estão preocupadas em falar e em impedir esse desmando na cidade.
O DU precisa ser parte do processo. Sim, é importante. Mas não transformar o
processo inteiro em sua imagem e semelhança. Pois é perigoso para um ativista
social e em várias causas ter que ouvir que um movimento conseguiu enquanto
movimento (que talvez já seja até ou esteja em iminência de se transformar numa
pessoa jurídica, organização não governamental ou porta-voz de muitos) tudo
isso que já conseguiu sem essas vozes e braços feitos anônimos.
Feita a ressalva ou o conjunto de
ressalvas simbolizadas aqui pela participação de várias vozes no processo e,
também, a noção de que as vitórias e conquistas são também do DU, mas não do DU
isoladamente, eu posso reiterar o meu apoio à causa e esperar, como tantos
recifenses, por um final desejável para as celeumas existentes e para os
desmandos dos grandes consórcios que visam tornar a cidade um quintal para os
seus cidadãos. Recife é muito mais que isso. Bem mais que isso.
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